quarta-feira, 14 de julho de 2010

44. Natureza Morta 1 - Peixe Palhaço

Mô Quiridu,

Todu mundo fala cô sô um baita dum presepero, contadori di inxtória i até mintiroso. Vo ti dizê pra ti, qui Ô nô sei menti. Nô tem? Ô goxto é di contá umaj passagi da minha vida i ti digo maj: Quaji tudu é verdade.
Ô sempre goxtei de pexcá imbarcado . O que argumaj pessoa nô sabi é cô fazia merguio di apinéia , quando era rapaj novo. Pra matá unj pexiho di pedra. Intendesse? I vô ti dizê pra ti, no tinha pra ningém, oh! Ô chegava a ficá dibaxo dágua di trêj a dizesej minute.
Num merguio dessi, Ô avixtei uma cosa qui nô dava di acreditá. Credo! Uma missidade de xepa de cigarro, na verdadi uma montuera de bagana. Ô cheguei perto para retirar aquela poluiçã toda e levá pra um lixo em terra. Nu cô si aproximei, um pexinho paiaço saiu di atraj daj bituca e começo a me fazê sinal.
Deu di intendê qui o bichinho tava querenu si comunicar-si cumigo. Ele ia, vinha, arrodiava, sartava, vortava, corria di cá, corria di lá. Foi quanu Ô si liguei, qui ele tava percuranu arguma cosa. Afinal Ô no so tanso, né oh!
Maj tu sabej cumé qui é pexe paiaço. Vévi perdenu aj cosa, principarmente oj filho, intendesse!
Então ô começei a fazê umaj preguntinha pro nabinha atravéj doj sinai:

- Pexinho tu taj percuranu arguma cosa?
Ele abalançô a cabecinha e disse que sim!
- Pexinho tu taj percuranu um amigo?
Ele abalançô a cabecinha e disse que não!
- Pexinho tu taj percuranu teu filho?
Ele abalançô a cabecinha e disse que não!
- Pexinho tu taj percuranu NEMU, é issu que tu taj percuranu?
Dinovo, ele abalançô a cabecinha e disse que não, maj com uma expressã toda inraivada, o ixtepô!

Foi quanu o pexe puxô uma bituca de cigarro infiô na boca e ampontô pra dita cuja. Ele tava era percurando fogo, aquele malino!
Ô disse pra ele qui era impossivi consegui fogo naquelaj condiçã, inda maj cô nem fumo rapaj. Daí, o bicho simfezosse todo e me disse uma missidade di disaforo, atravej da língua doj sinal. Nô dá nem di repeti o que aquele abobado me disse pra mim.
Bom, Ô chamei ele di paiaço, virei aj coxta e si fui imbora.
Agora uma cosa Ô tenho que ti dizê pra ti, Mô Quiridu:
Paiaço ,mesu, é quem joga bituca e otraj porcaria no mar.

Traduzindo.....

Meu Querido,
Todo mundo fala que sou um contador de histórias e mentiroso. Vou te dizer que eu nem sei mentir. Eu gosto é de contar umas passagens de minha e quase tudo é verdadeiro.
Eu sempre gostei de pescar embarcado. O que algumas pessoas não sabem é que eu fazia mergulho de apnéia, quando era jovem, para caçar uns peixinhos. E vou te dizer que não tinha para ninguém. Eu ficava de três a dezesseis minutos submerso. Num mergulho desses, eu avistei algo inacreditável. Uma imensidão de xepas de cigarro, na verdade um monte de bitucas. Cheguei perto, para retirar aquela
poluição toda e levá-la para o lixo, em terra. No que me aproximei, um peixinho
palhaço saiu de trás do lixo e começou a fazer sinais.
Entendi que o bichinho queria se comunicar comigo. Ele vinha, rodava, voltava, corria daqui e dali. Foi quando percebi que ele estava procurando algo. Afinal eu não sou bobo.
Mas tu sabes como são os peixes palhaços. Vivem perdendo suas coisas, principalmente os filhotes.
Então comecei a fazer perguntas, para ele, através de sinais:


- Peixinho tu estas procurando alguma coisa?
Ele balançou a cabeça e disse que sim.
- Peixinho tu estas procurando um amigo?
Ele balançou a cabeça e disse que não.
- Peixinho tu estas procurando o teu filho?
Ele balançou a cabeça e disse que não.
- Peixinho tu estas procurando NEMO?
Novamente ele balançou a cabeça e disse que não, mas agora com uma expressão de raiva.


Foi quando ele puxou uma bituca de cigarro, a colocou na boca e apontou para ela. O peixinho estava procurando fogo.
Eu disse que era impossível conseguir fogo naquelas condições e além disto, eu não
fumo. O bixo ficou nervoso e me disse uma enormidade de desaforos, através da linguagem dos sinais. Não dá para repetir o que ele me disse.
Bom, eu chamei ele de palhaço, virei as costas e fui embora.
Agora, eu preciso te dizer uma coisa, meu querido:
Palhaço, mesmo, é quem joga bituca e outras porcarias no mar.

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